A estagflação parece estar de volta no ocidente, mas qual o cenário na Ásia?

A economias ocidentais estão em alerta com os recentes sinais de que o mundo poderia estar caminhando para um cenário de inflação elevada com baixo crescimento. Mas, será que o mesmo é esperado nos países asiáticos?
A estagflação parece estar de volta no ocidente, mas qual o cenário na Ásia?
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Equipe Propague
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A década de 1970 foi marcada por um fenômeno conhecido como estagflação, isto é, baixo ou nenhum crescimento com elevadas taxas de inflação. Em 2022, 50 anos depois, a estagflação voltou a assombrar o mundo segundo diversos organismos internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial.

Em abril de 2022, o FMI apontou dados de projeção de crescimento global bastante reduzidos, cortando de 6,1% para 3,6 para o ano de 2022. Com respeito à inflação, o FMI estima que a taxa de inflação média se situe em 5.7% nos países desenvolvidos e 8.7% nas economias emergentes. Estes valores representam uma revisão para cima de 1.8% e 2.8%, em relação à mesma previsão feita em janeiro de 2022 pela instituição.

O Banco Mundial, por sua vez, espera que ocorra uma desaceleração da economia global na próxima década, ao passo que a inflação deva voltar ao patamar pré-pandemia até 2024, caso não ocorram novos choques de oferta. Esse cenário se deve a uma série de fatores que formaram uma “tempestade perfeita” na economia mundial, como a pandemia do covid-19, o acirramento da disputa entre EUA e China e a guerra da Ucrânia.

Estagflação: o que está levando a economia mundial para ela?

Nos primeiros meses da pandemia, em 2020, a inflação global foi contrabalanceada pela queda dos preços do petróleo e pelo colapso da demanda decorrente da interrupção das cadeias produtivas. Em um segundo momento, entretanto, a inflação global começou a aumentar com a recuperação dos preços não só do petróleo, mas também dos alimentos e a recuperação da atividade econômica após a flexibilização dos bloqueios impostos. Ademais, a escassez de determinados materiais como os semicondutores, também, pressionou os preços de diversos setores.

A despeito da pressão inflacionária, o ano de 2021 marcou um período de recuperação para boa parte das economias globais após o trágico ano de 2020. Em 2022, entretanto, essa recuperação foi travada por uma cadeia de novos acontecimentos.

A guerra na Ucrânia, para além de uma crise humanitária, provocou graves danos à economia global e gerou a elevação de pressão sobre os preços de energia e commodities graças ao importante papel que tanto a Ucrânia quanto a Rússia cumprem no fornecimento de alimentos e energia para as demais regiões, em especial para a Europa.

Além disso, a continuidade de surtos de covid-19 na China forçou, novamente, a interrupção de cadeias de suprimento no país devido aos lockdowns associados, gerando novas pressões sobre preços de energia, alimentos e semicondutores. Vale lembrar ainda, nos últimos anos, a China vinha liderando o crescimento mundial e uma possível desaceleração devido a tal contexto acaba sendo relevante para o cenário global.

Como consequência do aumento generalizado dos preços, espera-se que as taxas de juros subam como resposta das estratégias mais rígidas de política monetária dos bancos centrais, dificultando a recuperação das economias já fragilizadas após o impacto do covid-19.

Observando o cenário geral e identificando os principais fenômenos nos últimos anos, fica claro, então, o motivo de preocupação das principais autoridades financeiras mundiais com relação à queda nas expectativas de crescimento e aumento das pressões inflacionárias e, consequentemente, à estabilidade da economia mundial nos próximos anos.

Mas, será que essa é uma preocupação mais voltada para o ocidente? Confira, como as principais economias da Ásia estão se comportando frente ao novo cenário econômico.

Japão

A atividade econômica no Japão desacelerou no primeiro semestre de 2022, em meio à demanda doméstica fraca e à condições externas desfavoráveis. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) estima que o crescimento japonês seja de 1,7% no ano de 2022, o que representa uma queda de 1,2 pontos percentuais em relação a previsões anteriores. O esperado é que o crescimento permaneça estagnado no patamar de 1,7% nos próximos anos.

Ainda, de acordo com o Banco central japonês (BoC), o PIB real para o trimestre janeiro-março de 2022 foi de  -0,2%, registrando crescimento negativo pela primeira vez em dois trimestres. Esse resultado teria sido puxado pela queda no investimento fixo e o consumo de bens duráveis.

Vale destacar que o documento publicado pelo BoC traz expectativas diferentes sobre o crescimento em relação à OCDE. Nesse sentido, a instituição japonesa espera que, ao fim de 2022, o Japão tenha crescido 2,9% e prevê,  para os dois próximos anos, taxas de 1,9% e 1,1%. Com respeito à inflação, a projeção de junho da OCDE é que a inflação japonesa fique em 1,9% em 2022, resultado esse que contrasta com a previsão do fim de 2021, quando a instituição esperava um total de 0,7%.

O Banco Central japonês, entretanto, negou a possibilidade de estagflação na economia do Japão, mantendo a a expectativa de “japanificação”, ou seja: baixas taxas de juro, baixa inflação e baixo crescimento.

China

Já a China, após uma recuperação notável em 2021, com um crescimento de aproximadamente 8%, vive atualmente a expectativa de uma desaceleração significativa para 2022. A OCDE espera que o crescimento econômico caia para 4,4% ao fim deste ano e se recupere para 4,9% em 2023. O Banco Mundial, por sua vez, estimou a taxa de crescimento chinesa em 4,3% e 5,2% para o período 2022-2023.

Essa desaceleração se deve, principalmente, aos novos surtos de COVID-19 e à política de covid zero do governo chinês, que tem implementado bloqueios rigorosos. Além disso, soma-se a guerra na Ucrânia e a contração do mercado imobiliário. Para tentar reverter esse quadro, o governo chinês tem praticado políticas fiscais e monetárias expansionistas.

Vale destacar que, em relação ao resto do mundo, o crescimento chinês ainda é superior. No entanto, tem sido pontuado que a desaceleração já pode gerar consequências para a economia global

Com respeito às taxas de inflação na China, a previsão da OCDE feita em dezembro de 2021 para 2022 sofreu uma ligeira revisão de alta saindo de 1.73% para 2.03%.

Índia

A Índia, que junto a China vem puxando o crescimento global nos últimos anos, foi vítima do ambiente de incerteza internacional e também vive uma desaceleração na expectativa de crescimento.

Nesse sentido, a OCDE estima que o crescimento da economia indiana desacelere para 6,9% e 6,2% nos próximos dois anos. Entretanto, vale destacar que, ainda assim, os resultados sugerem que a Índia deve ser a economia que mais crescerá nos próximos anos. Ainda assim, o resultado esperado contrasta com a recuperação notável de 2021, quando cresceu a uma taxa de 8,7%.

De acordo com o Instituto Nacional de Política e Finanças Públicas (NIPFP), a situação não chega a ser preocupante, afinal a maioria dos setores já recuperou o nível pré-pandemia, com exceção dos setores intensivos em contato físico, como turismo, transporte e hotéis. Adicionalmente, as taxas de crescimento ainda são altas.

Com respeito à inflação, a OCDE reviu sua previsão de dezembro de 2021. Assim, a expectativa passou de 4,78% para 6,74%, um aumento que já coloca um certo ponto de atenção com relação ao controle de preços indiano.

Coreia do Sul

Já a economia coreana também obteve uma boa recuperação em 2021, com um crescimento real do PIB de 4,0%. Esse resultado foi puxado pelo forte crescimento de 9,9% das exportações, lideradas pelos semicondutores. Além disso, a política fiscal também contribuiu para a recuperação da Coreia.

Seguindo a tendência global, no entanto, a Coreia do Sul deve sofrer uma desaceleração em 2022. De acordo com a OCDE, o crescimento real deve cair para 2,7% e 2,5% em 2022 e 2023, respectivamente.

A inflação, por sua vez, saltou para 5,4% (ano a ano) em maio de 2022, a taxa mais alta desde 2008 e bem acima da meta de inflação de 2% do Banco da Coreia. Com isso, a OCDE, no documento publicado em junho de 2022, reviu as expectativas de inflação para cima. Em dezembro de 2021, a previsão era de uma taxa anual de inflação de 2.14%, já na revisão a taxa subiu para 4,75%.

Como resposta, o Banco Central coreano tem mantido uma política monetária conservadora, elevando os juros sistematicamente. Desde agosto de 2021 já foram seis aumentos, quando os juros saíram de 0,5% para os atuais 2,25%.

A estagflação, afinal, é uma realidade asiática?

Olhando para as quatros maiores economias da Ásia, parece cedo para falar de estagflação. O cenário chega a apontar taxas de crescimento menores, mas ainda altas em relação ao cenário internacional.

A Índia, por exemplo, caminha para manter uma taxa de crescimento elevada, apesar de uma ligeira desaceleração acompanhada de um aumento esperado da inflação.

O mesmo vale para a China: apesar de uma desaceleração, ainda mantém uma taxa de crescimento alta se comparada as economias do G20, com apenas Índia, Arábia Saudita e Indonésia tendo previsão de crescimento superior.

O Japão, por sua vez, segue a mesma tendência há décadas, isto é, baixo crescimento, baixa inflação e baixas taxas de juros.

Assim, embora as principais economias asiáticas estejam sentindo, na média, os impactos  da conjuntura atual em termos de projeção de crescimento e inflação, o fenômeno não parece ter a mesma urgência que a enfrentada pelas grandes economias ocidentais, que ao invés de desaceleração nas taxas de crescimento, já estão falando em possibilidade de recessão de fato.

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