Relatório de sustentabilidade: BC traz diretrizes de governança ambiental para o SFN

A publicação é parte da agenda BC# Sustentabilidade, lançada há um ano. Ao reconhecer o valor do tema na economia, o banco passa a analisar os riscos sociais, ambientais e das mudanças climáticas no mercado financeiro.
Relatório de sustentabilidade: BC traz diretrizes de governança ambiental para o SFN
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Equipe Propague
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Após lançar a Agenda #BC Sustentabilidade, em setembro de 2020, o Banco Central avança no tema e acaba de divulgar seu primeiro relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticas. A proposta é aprimorar a regulação, envolvendo os agentes sob sua supervisão no âmbito do Sistema Financeiro Nacional (SFN). Nesse sentido, inclui as práticas e o andamento de suas próprias ações relacionadas à gestão de riscos e oportunidades nessas áreas. Esses riscos e oportunidades, destaca, estão associados aos fatores ASG (ambientais, sociais e de governança), ou ainda, em inglês, ESG (environmental, social and governance), incluindo os riscos e as oportunidades das mudanças climáticas, que podem impactar o próprio BC e o SFN.

Dentre os critérios elencados em seu relatório de sustentabilidade, vale destacar a obrigação e inclusão de mudanças climáticas no gerenciamento de riscos dos bancos a partir do próximo ano. Há também outra norma que estabelece regras para que as instituições do SFN elaborem sua Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC), assim como para que padronizem a divulgação das informações sobre esses riscos e oportunidades aumentando, dessa forma, a transparência para o mercado.

Compõem ainda o conjunto de medidas, uma resolução que trata de impedimentos legais e infralegais (atos governamentais) já existentes e que sejam relacionados a questões sociais, ambientais e climáticas na contratação de crédito rural.

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A propósito, no que tange ao crédito rural, área bastante sensível ao meio ambiente e às mudanças climáticas, as iniciativas no âmbito do BC# Sustentabilidade incluem a evolução do Sistema de Operações do Crédito Rural e do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária – Proagro, o chamado Sicor, que passará a constituir um Bureau de Crédito Rural Sustentável. Este instrumento estará orientado pelos princípios do Open Banking, o que permitirá que beneficiários do crédito rural disponibilizem informações cadastradas no novo sistema a qualquer interessado, sem a necessidade de intermediação de agentes financeiros.

Com isso, a expectativa do BC é de que sejam oferecidas condições mais favoráveis aos produtores cujas iniciativas apresentem características sustentáveis no acesso a novos financiamentos rurais. Isso porque o cenário atual indica que as instituições financeiras devem mitigar de forma mais rigorosa o risco de concessão de crédito para financiamentos com maior risco social ou ambiental, avalia.

Ao mesmo tempo, emenda a autoridade monetária, as informações relativas às operações sustentáveis vão permitir a sua utilização por certificadoras de títulos de crédito verde, agências de rating especializadas nos critérios ambientais, sociais e de governança e prestadores de serviços contratados para auditar a aderência de empreendimentos a requisitos sociais e ambientais.

Riscos para o sistema financeiro

Ao apresentar o relatório de sustentabilidade, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, argumentou que há uma relação clara dos riscos sociais, ambientais e climáticos com os riscos tradicionais das instituições financeiras, como de crédito, operacional e os próprios do mercado, capazes de afetar a política monetária e o equilíbrio do sistema financeiro. “Choques ambientais e climáticos podem afetar a taxa de inflação. Esses choques são difíceis de prever, afetam a oferta e, assim, são mais difíceis para a política monetária”, afirmou.

Nesse sentido, complementou o executivo, os bancos centrais em todo o mundo precisam avaliar as vulnerabilidades do sistema financeiro em relação a esses riscos que podem provocar mudanças nas avaliações de ativos e perdas para o sistema.

Conforme disse, o BC tem, especialmente na última década, implementado medidas relacionadas ao assunto, como agora, com essas entregas da dimensão de sustentabilidade de sua agenda de trabalho.

Segundo o Banco, o Brasil é extremamente privilegiado no que se refere à variedade ambiental e climática. Possui biomas vastos e riquíssimos em biodiversidade animal e vegetal, além de alta tecnologia para manejo da agricultura e pecuária. “Com o apoio de um sistema financeiro avançado e capaz de prover recursos para esses setores com rapidez e eficiência, a transição para uma economia de baixo carbono pode, sem dúvida, ser benéfica para o desenvolvimento do país”, afirma.

Ainda de acordo com ele, “há um grande esforço coordenado e global para identificação e quantificação dos riscos e das oportunidades que permitam ações efetivas para reduzir as desigualdades e alcançar uma relação mais equilibrada da atividade econômica com a natureza”.

Leia também: Mudança climática: como os bancos centrais calculam impacto nas finanças?

Relatório de sustentabilidade e a gestão de riscos

Em seu relatório de sustentabilidade, o BC reforça que as novas regras de gerenciamento de riscos têm como foco o tratamento da possibilidade de perdas para as instituições reguladas e estão alinhadas com as recentes recomendações e tendências internacionais em torno da gestão dos riscos climáticos e ambientais, e da transparência em relação a eles.

No âmbito climático, o Banco destaca os riscos de perdas financeiras com desastres naturais, como secas, enchentes, tempestades, ciclones, geadas e incêndios florestais, que podem trazer riscos operacionais e de crédito, já que são eventos com impacto na produtividade das empresas.

Já na área ambiental, aponta a publicação, os riscos, estão associados, por exemplo, ao financiamento de empreendimentos que devem cumprir exigências ambientais e estão sujeitos a embargos. Entre essas ameaças, estão o desmatamento ilegal, incêndio criminoso em mata ou floresta, degradação de biomas ou da biodiversidade e poluição irregular do ar, das águas ou do solo. Assim como desastre ambiental resultante de intervenção humana, incluindo rompimento de barragem, acidente nuclear ou derramamento de produtos químicos ou resíduos no solo ou nas águas.

Essas são as razões pelas quais os bancos devem monitorar os eventos ambientais e criar iniciativas de prevenção, orienta a autoridade monetária, incluindo inclusive essas questões em “testes de estresse” – quando é simulado o pior cenário econômico e como o sistema financeiro se comportaria. “Resultados ruins nos testes de estresse, por exemplo, vão requerer mais capital para fazer frente aos riscos”, destaca o relatório. Ou seja, o objetivo do BC é avaliar se um banco, ou um conjunto de instituições financeiras, possui capital suficiente para cobrir eventuais perdas em cenários severos.

Por fim, os riscos sociais estão atrelados à percepção dos clientes sobre as próprias instituições financeiras, o que pode impactar a realização de negócios. Nesse sentido, o BC considera como ameaças a ocorrência ou indícios de atos de assédio, de discriminação ou de preconceito de qualquer natureza, prática relacionada ao trabalho em condições análogas à escravidão, exploração infantil, entre outros.

Políticas e processos internos do BC

As medidas elencadas no relatório de sustentabilidade do BC trazem também mudanças nos processos internos da autarquia. Entre elas, destaca-se a redução do impacto ambiental nos meios circulantes, ou seja, produção e distribuição de papel-moeda; e a publicação anual de um relatório de riscos socioambientais para prestação de contas, como este agora divulgado.

Além disso, foram criados critérios de sustentabilidade para a seleção de contrapartes para as operações de investimento das reservas internacionais a partir de dezembro deste ano. Esses critérios serão usados para eventuais rodízios entre as instituições financeiras elegíveis para operar com o BC. Segundo a autoridade monetária isto irá incentivar os bancos a atentarem cada vez mais para suas ações em relação aos riscos e oportunidades sociais, ambientais e climáticas.

Ao mesmo tempo, o BC vai estabelecer ainda uma linha financeira de liquidez sustentável. Ou seja, uma espécie de empréstimo para bancos, a partir de novembro de 2021.

Parcerias para a sustentabilidade

Entre os itens da agenda de ações do BC# Sustentabilidade está também o estabelecimento de parcerias a fim de direcionar a atuação do Banco. De acordo com o relatório de sustentabilidade ora publicado, essas parcerias já foram concretizadas.

A primeira delas foi a assinatura de um Memorando de Entendimento com a Climate Bond Initiative (CBI), organização sem fins lucrativos que apoia o desenvolvimento de instrumentos financeiros verdes, para acelerar a transição para uma economia global de baixo carbono.

Outra parceria diz respeito a uma expressão formal de apoio às recomendações da Task Force on Climate-related Financial Disclosure (TCFD), que trabalha para ampliar e aprimorar a publicação de informações financeiras relacionadas ao clima por parte das empresas e outras organizações.

Por fim, temos ainda a adesão à Network for Greening the Financial System (NGFS), uma rede de cooperação entre bancos centrais e autoridades de supervisão que busca fomentar a adoção de práticas sustentáveis no sistema financeiro.

Relatório de sustentabilidade: o BC está alinhado com a agenda global?

Em escala global, o que se observa é que o BC brasileiro não está sozinho quando o assunto é sustentabilidade. Desde 2017, bancos centrais de todo o mundo têm se reunido em torno de uma rede formal, no caso a NGFS, acelerando importante troca de experiências, recomendações e melhores práticas.

De olho nesse cenário, em julho de 2021, o Instituto Propague divulgou a segunda edição da Carta Propague – relatório periódico para acompanhamentos e análises sobre tendências regulatórias para o sistema financeiro e mercado de pagamentos – por meio da qual lançou um olhar para as agendas regulatórias de sustentabilidade e evolução do mercado de finanças sustentáveis, a fim de oferecer um panorama de tendências para o Brasil.

O BC, por meio do seu primeiro relatório de sustentabilidade, dá sinais de alinhamento com as agendas globais e tendências de regulação apontadas pelos pesquisadores do Instituto. Afinal, a própria divulgação do relatório, com periodicidade anual, vai ao encontro do pilar informação, ao prestar contas ao mercado de suas ações e ao estabelecer normas a serem seguidas pelos agentes regulados.

Ao mesmo tempo, isso se reforça com a obrigação e inclusão de mudanças climáticas no gerenciamento de riscos dos bancos a partir do próximo ano e com a norma que estabelece regras para que as instituições do SFN elaborem sua Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática, assim como para que padronizem a divulgação das informações sobre esses riscos e oportunidades aumentando a transparência para o público.

O BC também confirmou a criação do Bureau de Crédito Rural Sustentável e o estabelecimento de incentivos à sustentabilidade das operações de crédito nessa área, previsto para vigorar a partir de dezembro de 2022.

Outro ponto a destacar é a estruturação e ampliação da coleta de informações sobre riscos sociais, ambientais e climáticos, norma que passa a valer já em dezembro deste ano, o que levará, por sua vez, à construção de testes de estresse para riscos climáticos que devem começar a valer em abril do ano que vem.

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