Os prognósticos em torno dos riscos ambientais e seus impactos sobre a atividade econômica remetem a sérias repercussões no mundo todo. Entre elas, estão os possíveis reflexos no mercado de trabalho, aponta Joseph Feyertag, membro do Grantham Research Institute, da Escola de Economia de Londres.
Primeiramente, ele explica que a escassez de mão-de-obra qualificada tende a rapidamente se tornar uma barreira crítica para alcançar os objetivos climáticos do Acordo de Paris, estabelecido em 2015.
Nesse sentido, em artigo publicado pelo OMFIF, Feyertag argumenta que mesmo que os países tenham capital financeiro suficiente para cobrir as necessidades de investimento na adaptação e mitigação dos riscos ambientais e climáticos até 2030, esses recursos poderão não ser capazes de construir infraestruturas, explorar energias renováveis ou, executar projetos de produção indispensáveis, se não houver trabalhadores devidamente preparados à disposição.
E mais: mercados de trabalho excessivamente restritivos não representam apenas um risco para os governos que tentam atingir metas líquidas zero carbono, mas também para os objetivos básicos de preços e estabilidade financeira dos bancos centrais e demais reguladores.
Repercussões no âmbito do G20
De acordo com o especialista, quando se analisa os riscos ambientais e possíveis reflexos no mercado de trabalho no contexto do G20, grupo das 20 economias mais desenvolvidas do mundo, a previsão é de que Estados Unidos (EUA), Reino Unido, União Europeia, Arábia Saudita, Japão, Coreia do Sul e Austrália, por exemplo, irão sofrer uma grave escassez de mão-de-obra até 2030.
No total, Feyertag aponta que serão necessários quase 13 milhões de trabalhadores adicionais em todo o G20 para satisfazer a demanda em indústrias verdes em crescimento, como as de energias renováveis e a fabricação de veículos elétricos.
Conforme disse, se as condições atuais do mercado de trabalho persistirem, essas vagas suplementares permanecerão em aberto, mesmo tendo em conta a necessidade de realocação de trabalhadores provenientes de setores não sustentáveis.
Riscos ambientais, produtividade e ocupação
Ainda segundo Feyertag, apesar de as recentes mudanças tecnológicas resultarem em aumento da produtividade do trabalho e isso ajudar a suprir parte da procura adicional por mão-de-obra, sobretudo no desenvolvimento de tecnologias que possam mitigar as emissões de gases poluentes, outro fator crítico é o impacto das próprias alterações climáticas e riscos ambientais.
Em outras palavras, mesmo em um cenário relativamente positivo, com elevação da temperatura terrestre limitada em 1,5°C, o aumento da frequência e intensidade das ondas de calor poderá reduzir 2% do total de horas trabalhadas anualmente, correspondendo a 78 milhões de empregos em tempo integral.
Para ele, isso será sentido principalmente em áreas já quentes e úmidas do Sul global, com a Índia amargando sozinha perdas de produtividade equivalentes a 34 milhões de empregos devido a combinações extremas de calor e umidade.
Mesmo América do Norte e Europa, alerta, não estão imunes. Afinal, as recentes ondas de calor levaram a perdas de produtividade de 8% a 9% no sul da Europa e a uma redução de 23% na oferta de mão-de-obra nos EUA.
Outra grande incógnita, afirma, é o efeito potencial que os riscos ambientais, em parte causados pelas alterações climáticas, terá sobre os trabalhadores.
Na sua avaliação, como cerca de 1,2 bilhão de empregos em todo o mundo, especialmente em indústrias primárias, dependem de bens e serviços ecossistêmicos, se esses serviços ficarem sobrecarregados ou falharem completamente, isso representa uma ameaça à subsistência das pessoas que deles dependem.
E ainda que muitos desses efeitos sejam graduais, Feyertag argumenta que uma perda súbita desses serviços causaria um choque de oferta nos mercados de trabalho, forçando as pessoas a procurar oportunidades alternativas.
Porém, apesar de o aumento da procura por empregos verdes possa absorver parte desses trabalhadores, países como China, Índia, Indonésia, México e Turquia correm risco de maior desemprego.
O papel dos bancos centrais
A fim de ajudar a atenuar esse cenário, Feyertag argumenta que os bancos centrais podem incorporar os reflexos dos riscos ambientais no mercado de trabalho, nos seus modelos e prognósticos.
Ao mesmo tempo, ele acrescenta, os bancos centrais também podem implementar instrumentos políticos mais específicos para estimular a procura e a oferta de trabalho quando disponíveis.
Em mercados emergentes, exemplifica, muitos bancos centrais têm a capacidade de promover a inclusão financeira, que é uma ferramenta fundamental para aumentar a resiliência dos trabalhadores em relação aos efeitos das alterações climáticas e riscos ambientais.
Ao passo que, para além dos bancos centrais, os decisores de política fiscal podem implementar ferramentas, instrumentos e leis necessárias para garantir que os trabalhadores sejam protegidos em casos de transições desordenadas e dos impactos crescentes desses riscos.
Além disso, nos países mais afetados, geralmente menos responsáveis pela crise climática, existe a possibilidade de investimentos públicos em capacidade adaptativa financiados por organismos internacionais, e em mercados de trabalho restritivos, os governos podem atrair grupos marginalizados para aumentar a mão-de-obra disponível.
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