Embora a matéria tramite desde 2020, somente em abril de 2024 o texto preliminar do Projeto de Lei (PL) que almeja regulamentar o uso da inteligência artificial (IA) no Brasil foi apresentado no Congresso Nacional.
Trata-se do PL 2338/2023, popularmente chamado de Marco Legal da IA, proposto originalmente pelo atual presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, com base em um trabalho previamente desenvolvido por um comitê de juristas.
Contudo, o texto atual é mais abrangente, pois acabou contemplando outros projetos sobre o mesmo tema, a exemplo do PL 21/2020, do deputado Bismarck Maia, que já havia obtido aprovação na Câmara dos Deputados.
O novo texto foi exposto na Comissão Temporária Interna sobre IA no Brasil, a CTIA, instalada no Senado em agosto de 2023 e que estava prevista para funcionar até 23 de maio de 2024.
Porém, segundo o relator do PL, senador Eduardo Gomes, como não houve tempo suficiente para analisar o volume de sugestões encaminhadas pelas partes interessadas, incluindo a sociedade civil, as agências reguladoras e o governo federal, o prazo de vigência da CTIA foi prorrogado por mais 55 dias.
Segundo Gomes, esse tempo será suficiente para amadurecer ainda mais o debate em torno da regulação da IA no Brasil e apresentar a versão final do documento.
A previsão para a apresentação é dia 5 de junho de 2024, que deve passar por uma sessão temática no plenário do Senado cinco dias depois, ao passo que a votação do texto está inicialmente marcada para 18 do mesmo mês. Entretanto, esse cronograma ainda pode mudar.
Após a conclusão desse trâmite, a expectativa é de que o documento seja revisado e finalizado para ser divulgado pelo governo federal na cúpula do G20, programada para os dias 18 e 19 de novembro de 2024.
O que diz o Marco Legal da IA sobre direitos, proibições, supervisão e riscos
Entre os pontos principais do texto sobre a regulação de IA a ser votado no Senado, vale destacar as disposições sobre direitos e proibições, supervisão, riscos, sanções, direitos autorais e de personalidades e, ainda, a segurança pública.
Com relação à primeira disposição, o documento aborda o direito prévio à informação acerca das interações das pessoas com os sistemas baseados em IA, à proteção e privacidade de dados pessoais; à vontade e participação humana em decisões desses sistemas; à não-discriminação e à reparação de vieses nessa direção, não importando a natureza, ou seja, se diretos ou indiretos, ilegais ou abusivos.
Quanto às proibições, o texto menciona o uso da IA que leve os usuários a agirem de forma a prejudicar a sua saúde ou a de outros, além de sistemas de armas autônomas que não possibilitem o controle humano.
São vetados, ainda, a aplicação da IA para avaliar características e histórico pessoal em análises de ameaças de crime, assim como sistemas que viabilizem a criação e disseminação de material que possa representar abuso ou exploração sexual infantil.
No que tange à supervisão, o PL define que haverá um Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA) para acompanhar o cumprimento da legislação.
Em relação aos riscos, o texto prevê a análise de possíveis ameaças antes do lançamento dos sistemas de IA no mercado. Assim, sendo considerado de risco classificado como excessivo, os sistemas serão vetados.
Paralelamente à SIA, também poderão existir associações privadas para efeitos de autorregulação, inclusive com critérios técnicos próprios, mas desde que alinhadas ao órgão gestor.
Disposições sobre direito autoral e de personalidade
Sobre a proteção de conteúdos, a proposta confere aos autores o direito de limitar a utilização de suas criações em sistemas de IA.
Também consta do texto a categorização do que não representa ofensa a direitos autorais e sobre aquilo que é restrito às instituições de pesquisa e educacionais, ao jornalismo, bibliotecas, museus e arquivos.
Determinações sobre segurança pública
Ao tratar dos termos de uso da IA na segurança pública, o documento proíbe o uso dos sistemas de identificação por biometria à distância, salvo em situações como a busca de vítimas ou de desaparecidos e recaptura de fugitivos.
No entanto, os sistemas baseados em IA podem ser aplicados para investigar infrações em flagrante, considerando crimes com penas superiores a dois anos.
Além disso, o PL estabelece ainda que, durante a utilização de sistemas de armas autônomas é obrigatório o emprego de controle humano intenso e deve haver observância das regras relativas ao Direito Internacional Humanitário e ao Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Sanções ao uso indevido da IA
Por fim, as regras propostas contemplam advertências a quem infringir a legislação de IA. Ademais, se houver reincidência será aplicada uma multa de até R$50 milhões por infração. Porém, em se tratando de empresas de direito privado, o montante poderá chegar a 2% da sua receita.
Vale destacar que além de toda infração à lei de IA se tornar pública, poderá ocorrer de a autoridade competente proibir o infrator de participar de sandboxes regulatórios por um prazo de até cinco anos.
Em última instância, poderá haver a interrupção seja parcial ou total, temporária e até definitiva, do desenvolvimento, oferta ou operação de sistemas de IA, bem como a proibição de processamento de bases de dados específicas.
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