A saúde financeira dos brasileiros está equilibrada sobre uma corda bamba. A pesquisa “Endividamento e Inadimplência do Consumidor” da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) revelou que o endividamento das famílias brasileiras chegou a um nível recorde no último mês de julho: mais de 71% dos brasileiros possuem alguma dívida. Dentre esses, 42% estão com mais de 90 dias de atraso no pagamento.

Parte do problema é que a renda da maioria não é suficiente para cobrir as despesas mensais. Segundo a pesquisa “Empréstimos Pessoais e Hábitos dos Consumidores”, encomendada pela Globo, mais de 70% das pessoas não conseguem poupar, sendo que 43% ganham menos do que gastam e 32% ganham exatamente o que precisam para fechar as contas.

Educação financeira entre as saídas para o superendividamento

O endividamento em si não é sinônimo de contratempo. Porém, a dificuldade de pagar dívidas pode se transformar num problema estrutural se as medidas adequadas não forem tomadas. Segundo levantamento do BCB e da Febraban, apenas 38% dos brasileiros considera que saber perceber quando precisa de orientações sobre como lidar com o dinheiro.

Aí entra o papel das instituições financeiras e do setor público para ajudar os tomadores de dívida a se informarem sobre os produtos de crédito e escolherem as melhores opções para manter a saúde financeira em dia. Além das taxas de juros, as dívidas podem ter outros encargos, como multas e tarifas, que as tornam mais caras, mas nem sempre ficam claros para os clientes quando contratam o crédito.

Segundo o monitoramento da CNC, 1 em cada 5 endividados tem mais de 50% da renda comprometida com dívidas. Essa situação pode configurar o superendividamento, que foi definido como a “impossibilidade manifesta de o consumidor, pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo existencial” pela Lei 14.181/21, sancionada em 02 de julho de 2021.

Em um estudo da Série Cidadania Financeira, o Banco Central explica que o superendividamento não se resume a um atraso no pagamento das dívidas, ou simplesmente um valor alto em débito. Trata-se de uma situação estrutural e também subjetiva: resulta de um processo em que o padrão de vida das famílias sofre um impacto negativo duradouro devido à dificuldade de pagar as dívidas.

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Índice de Saúde Financeira do Brasileiro busca melhorar o diagnóstico

Diante desse cenário de superendividamento por parte dos brasileiros, o Banco Central lançou um projeto para ajudar a diagnosticar a situação da saúde financeira dos brasileiros. O Índice de Saúde Financeira do Brasileiro (I-SFB), desenvolvido em conjunto com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), combina 15 questões para avaliar o nível de saúde financeira de cada usuário, em todas as faixas de renda.

O índice vai de 0 a 100 e considera quatro eixos que indicam que a pessoa tem uma situação financeira saudável: a capacidade de se informar para tomar decisões acertadas, a capacidade de controlar gastos para se manter dentro do orçamento, e o quanto a situação financeira é fonte de liberdade ou provoca estresse e incerteza sobre o futuro.

Para calibrar o I-SFB, a pesquisa entrevistou mais de 5 mil pessoas no Brasil. Em média, a pontuação dos brasileiros é de 57 pontos, o que indica uma situação financeira equilibrada, mas com pouco espaço – alguns erros podem transformar as dívidas em um problema. 48% dos brasileiros está abaixo da média, enquanto 41% está acima.

A ferramenta criada tem o objetivo de ajudar consumidores a entenderem como está a sua relação com as finanças – entre dívidas e investimentos – e promover a educação financeira, mas o I-SFB também oferece um diagnóstico para o próprio Banco Central e as instituições no mercado de crédito.

“O índice também vai permitir que seja realizado um diagnóstico amplo da saúde financeira de toda a população brasileira. Para o sistema financeiro, esse diagnóstico vai possibilitar o desenho e a oferta de produtos e serviços financeiros mais adequados às reais necessidades de seus clientes e usuários. Para o setor público, o índice trará informações mais sólidas e o desenvolvimento e a melhora de políticas públicas voltadas à educação e à inclusão financeira”, afirmou Maurício Moura, diretor de Relacionamento, Cidadania e Supervisão de Conduta do Banco Central na ocasião de lançamento do programa.

Superendividados devem receber tratamento especial dos bancos

Em paralelo ao projeto do Índice de Saúde Financeira dos Brasileiros, a Febraban atualizou as regras do Sistema de Autorregulação Bancária, e os bancos devem se ajustar para atender melhor os clientes em situação de superendividamento. Entrou em vigor no final de julho de 2021 o normativo da entidade que prevê que clientes considerados especialmente vulneráveis devem receber mais atenção das instituições financeiras, que devem ofertar apenas produtos e serviços adequados às necessidades e interesses desse perfil.

Sete fatores podem caracterizar um cliente como especialmente vulnerável de acordo com o documento. Além do superendividamento, constam deficiência física ou mental, doença grave, grau de escolaridade, familiaridade com os meios digitais, idade e renda. As instituições financeiras deverão identificar na base de clientes quem pode se encaixar no perfil e monitorar o risco a que estão expostos e as ferramentas que podem ajudá-los.

No comunicado da Febraban, não há mais detalhes sobre quais serão as políticas adotadas para melhorar a situação financeira dos clientes considerados mais vulneráveis. Contudo, a entidade avisa que todo o quadro de funcionários das instituições financeiras e correspondentes bancários passarão por treinamentos sobre as novas regras para evitar que a política assuma tom discriminatório contra os clientes identificados dentro do perfil de vulnerabilidade.

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