Entenda o endividamento das famílias no Brasil e nos países do BRICS

Nos últimos anos, o endividamento das famílias tem se tornado um problema cada vez mais preocupante, especialmente após a crise do Covid-19. Entre os países do BRICS o endividamento varia, com África do Sul e Índia apresentando endividamentos semelhantes ao brasileiro. Apesar disso, é preciso levar em consideração o contexto de cada país.
Entenda o endividamento das famílias no Brasil e nos países do BRICS
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Equipe Propague
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O endividamento das famílias é uma questão que vem chamando atenção nos últimos anos, tendo se tornado um problema muito debatido após a crise do Covid-19 que deixou como legado a falência de empresas, o aumento do desemprego e perda de renda.

O fenômeno do endividamento se caracteriza pela situação em que as famílias comprometem uma parcela muito relevante da sua renda com dívidas o que, muitas vezes, leva à inadimplência, podendo comprometer a estabilidade financeira e, em última instância, prejudicar funcionamento do sistema financeiro como um todo.

Existem diversas razões que podem levar uma família ao endividamento, como o desemprego, a queda da renda familiar, o aumento dos preços dos produtos e serviços essenciais, além de falta de planejamento e educação financeira. Em muitos casos, a combinação desses fatores pode tornar a situação ainda mais difícil de ser contornada.

Diante do cenário macroeconômico internacional, com inflação e alta de juros, tem se observado um aumento no endividamento das famílias. Nesse sentido, é interessante entender a situação no Brasil e compará-la com outros países emergentes.

Cresce o endividamento das famílias no Brasil

No Brasil, de acordo com a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) anual divulgada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 77,9% de famílias se declararam endividadas.

Na comparação anual, a alta na parcela de endividados, em 2022, foi de sete pontos percentuais em relação a 2021 e de 14,3 pontos em relação a 2019. Além disso, a inadimplência bateu recorde em 2022, atingindo 3 em cada 10 famílias.

Ademais, de acordo com dados da OCDE, cerca de 45% da renda disponível brasileira está comprometida com dívidas. Renda disponível é aquela que sobra para as famílias após serem descontados os impostos. Já levando em conta o endividamento das famílias como porcentagem do PIB, o valor é de 33.7%, conforme dados do FMI.

Esses valores indicam um aumento do endividamento das famílias em um cenário de elevado desemprego e baixo crescimento, o que torna preocupante a situação no Brasil. Tanto é que o governo vem estudando um programa de renegociação das dívidas das famílias, o “Desenrola”.

Um exercício interessante é comparar o cenário do endividamento no Brasil com a situação de outras economias emergentes, especialmente de seus parceiros no BRICS (grupo composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) e entender o cenário no grupo.

Antes, é importante destacar que uma comparação pura entre os indicadores não permite uma avaliação robusta, sendo necessário levar em conta as particularidades de cada economia, prestando atenção a outros indicadores como, por exemplo, desemprego, crescimento da renda e renda per capita.

Endividamento das famílias difere entre os países do BRICS

Nesse sentido, o endividamento das famílias no BRICS varia significativamente entre os países, refletindo as diferentes realidades econômicas e sociais de cada nação. Embora alguns países apresentem níveis mais elevados de endividamento, outros têm conseguido manter o endividamento em níveis mais baixos.

A Índia e a África do Sul apresentaram níveis de endividamento semelhantes ao brasileiro, com 34,6% e 34,22% do PIB comprometidos com dívidas, respectivamente. Já a Rússia apresentou um índice relativamente mais baixo, com apenas 21,76% do PIB comprometido com dívidas em 2021.

Por outro lado, a China apresentou o nível mais alto de endividamento das famílias no BRICS, com 62,14% do PIB, de acordo com dados do FMI. Esse alto endividamento pode ser atribuído, em parte, ao crescimento do mercado imobiliário chinês, que tem levado muitas famílias a contrair empréstimos para comprar imóveis.

Endividamento das famílias chinesas se deve ao crescimento do setor imobiliário

De acordo com um estudo feito pelo banco central australiano sobre a dívida das famílias na China, a dívida hipotecária foi a maior impulsionadora do endividamento familiar ao longo da última década, de modo que, em 2019, representava cerca de metade desse endividamento.

Esse movimento reflete tanto os baixos níveis de juros praticados ao longo dos anos 2010, quanto o aumento da renda e o aumento do preço dos imóveis. Com isso, as famílias expandiriam sua capacidade de tomar crédito ao mesmo tempo em que os preços imobiliários subiram, exigindo, naturalmente, um endividamento maior para ter acesso a um imóvel.

Outra característica particular do caso chinês diz respeito à oferta de crédito que, em geral, advém de bancos públicos, responsáveis por cerca de 50% do crédito às famílias.

Banco Central indiano considera o endividamento das famílias sustentável

Já na índia, de acordo com um estudo do Banco Central Indiano (RBI), as famílias têm tomado mais crédito junto às instituições financeiras do país, sendo os bancos comerciais os principais responsáveis por suprir essa demanda, com aproximadamente 72% do total.

De acordo com o RBI, esse aumento foi consequência da pandemia e da crise decorrente do avanço da COVID-19. O que pode ser atestado pelo aumento das responsabilidades financeiras das famílias provenientes de bancos comerciais como porcentagem do PIB de 39,5% no quarto trimestre de 2020 durante a pandemia, em comparação com 35,4% o mesmo período de 2019.

O RBI, entretanto, destaca que esse aumento não é preocupante e que, apesar do aumento do endividamento nos piores momentos da pandemia, o nível de endividamento das famílias permaneceu relativamente estável ao longo dos últimos 30 anos.

Aumento no custo e baixa renda per capita estão por trás do endividamento na África do Sul

Por outro lado, na África do Sul, o cenário levanta preocupações, pois o endividamento está atingindo patamares elevados. De acordo com o boletim trimestral do banco central sul africano, o endividamento das famílias como porcentagem da renda disponível atingiu 62,3% no quarto trimestre de 2022.

Ademais, o custo de serviço da dívida das famílias em relação à renda disponível esteve em 8,1% no mesmo período, representando um aumento de 0.6% em relação ao trimestre anterior. Esse aumento se deve tanto a elevação dos juros quanto ao aumento do estoque de dívida das famílias.

Entre as causas para este endividamento estão a elevação do custo de dívida em um cenário de baixa renda per capita, falta de proteção contra práticas predatórias de credores e o aumento nas taxas de juros.

Banco central russo demonstra preocupação com endividamento das famílias

Outro país que vem demostrando preocupação com o endividamento das famílias é a Rússia. Apesar de ser o país com menor nível de endividamento como proporção do PIB entre os BRICS, as condições econômicas atuais preocupam as autoridades.

Por isso, o Bank of Russia (CBR) estabeleceu limites de empréstimos de consumo não garantidos (microempréstimos) para o primeiro trimestre de 2023. As medidas são direcionadas tanto para bancos licenciados quanto para organizações de microfinanças (MFOs).

O banco está preocupado, principalmente, com os empréstimos com prazo de vencimentos acima de 5 anos e com os empréstimos voltados para indivíduos com a relação serviço da dívida/renda (DSTI) acima de 80%. Ou seja, aqueles indivíduos cujo comprometimento da renda mensal com pagamento de serviço da dívida é superior a 80%.

Assim, os bancos licenciados terão que limitar o valor de empréstimos ao consumidor com DSTI acima de 80% ao percentual de 25%, durante o 1º trimestre de 2023. Já as instituições de microfinanças terão que respeitar o limite de 80%.

 

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