Moedas digitais como a moeda digital de banco central (CBDC) e stablecoins têm sido vistas por alguns países como prováveis substitutas para a moeda fiduciária nos pagamentos e transferências eletrônicas. Nesse contexto, a África permanece como um dos maiores mercados. Na verdade, desde que a Nigéria lançou a e-Naira, vários bancos centrais africanos passaram a se aproximar da moeda digital ou já possuem projetos em estágio de teste para o seu lançamento. Entretanto, questões como conformidade regulatória, inclusão financeira e, em especial, interoperabilidade seguem encabeçando as pautas dos diversos projetos.
Com relação à interoperabilidade, os especialistas argumentam que de nada adianta dispor de versões digitais de moedas fiduciárias se estas não forem capazes de interagir fora do ambiente doméstico. A questão tem sido, inclusive, abordada por reguladores como o Banco de compensações Internacionais (BIS) e o Banco Central Europeu (BCE).
Agora, um novo capítulo está sendo escrito sobre o desenvolvimento de uma moeda digital, tendo em vista a intenção do Banco dos Estados da África Central (BEAC) de projetar uma moeda digital comum para os países-membros. O BEAC responde por Camarões, Chade, Gabão, Guiné Equatorial, República Centro-Africana e República do Congo e pode se tornar o primeiro banco regional no continente a lançar uma moeda digital conjunta.
Isso porque o Conselho de Administração solicitou ao banco que adote uma moeda digital objetivando atualizar as estruturas de pagamento, facilitar as movimentações financeiras entre países, assim como promover a inclusão financeira na região.
Segundo analistas, a iniciativa também surge como uma resposta à aceitação do bitcoin como moeda legal em países africanos, como a República Centro-Africana, que após essa medida, também divulgou que adotará sua própria criptomoeda, a Sango Coin. Cenário que, conforme se posicionou o BEAC, pode ser incompatível com acordos e convenções que regem a União Monetária da África Central e os estatutos do banco.
O que dizem os reguladores sobre moeda digital e interoperabilidade
Um dos reguladores internacionais que vem se manifestando sobre a questão da interoperabilidade no âmbito da moeda digital, em especial a CBDC, é o BIS. Para o banco, a interoperabilidade é fundamental no sentido de aprimorar as transações transfronteiriças que ainda sofrem com a falta de velocidade, transparência e acesso, além dos custos altos.
Tanto que um relatório lançado por seu Comitê de Pagamentos e Infraestruturas de Mercado (CPMI) e pelo Centro de Inovação do BIS, conjuntamente com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, sugere opções de acesso e interoperabilidade da CBDC para pagamentos internacionais. Aliás, a publicação destaca que essa moeda digital apresenta um benefício importante ao poder considerar a funcionalidade transfronteiriça já durante a fase inicial de desenvolvimento.
Ademais, o BIS afirma que, embora não exista um modelo único, qualquer sistema deve ser pensado em termos de flexibilidade com o propósito de se adaptar tanto a um mundo em constante mudança como aos diferentes modelos de CBDC que vão surgir, promovendo sua coexistência.
Nessa mesma direção, se posiciona a Comissão Europeia, que estuda juntamente como Banco Central Europeu (BCE) um modelo para o euro digital. Também por meio de relatório, o BCE adiantou algumas considerações sobre o design e objetivos da moeda digital comum ao bloco.
Uma das questões levantadas foi o surgimento de outras CBDCs em grandes economias e seu uso transfronteiriço, o que justifica o lançamento do euro digital a fim de garantir a continuidade do papel internacional da sua moeda fiduciária.
Para o BCE, a moeda digital de banco central oferece vantagens em termos de eficiência, liquidez, escalabilidade e segurança, podendo ser utilizada para facilitar pagamentos internacionais, aumentando, assim, a atratividade da moeda e seu uso como moeda global de unidade de pagamento.
Por que a interoperabilidade é importante?
De acordo com diversos atores que compõem o sistema financeiro, a interoperabilidade é uma questão crítica, pois é ela que vai permitir que uma moeda digital, a exemplo da CBDC, interaja com o resto do mundo. Dessa forma, se configura como um pré-requisito para que a moeda digital seja completamente operacional bem como se apresente como uma solução eficaz ante ao que já existe.
Assim, a questão que fica é: à medida que os bancos centrais planejam e desenvolvem versões digitais de suas moedas, eles estão pensando na compatibilidade com os sistemas de pagamentos ao redor do mundo e, ainda, com as blockchains privadas?
O fato é que, defendem os especialistas, para uma moeda digital, a multifuncionalidade e a capacidade de ser multiplataforma é crucial. É importante que isso seja levado em conta, sejam em projetos de moeda digital comum, como as propostas por bancos regionais, como o BEAC e o BCE, ou individuais desenvolvidas pelos bancos centrais de cada nação.
Leia mais:
Real Digital: entenda as diretrizes do Banco Central para a moeda digital brasileira
Moedas digitais: a solução do Caribe para inclusão financeira
Debates sobre moedas digitais avançam no mercado de pagamentos
Dólar digital: novidades do FED para a moeda digital americana
Moedas digitais: como afetam o sistema financeiro e as soluções dos bancos centrais